ANTÍDOTOS CONTRA A TOXIDEZ DA GANÂNCIA.

09:00Apenas Evangelho


Leiam Lucas 12.13-21 

por Sandro VS 

Uma das características mais marcantes do homem natural é o egoísmo, ou seja, a decisão deliberada de pensar só em si mesmo e, por consequência, não repartir absolutamente nada do que é seu. Esse traço é tão marcante e está tão enraizado em nós após a queda no pecado de nossos representantes no jardim, que ele já se manifesta na infância. Esta fase existencial do ser humano é onde, sem duvidas, o egoísmo é mais perceptível e a razão dessa afirmação é porque o pecado praticado no berço da vida é por natureza e não por consciência, ou seja, é o padrão humano de comportamento sem o entendimento de uma vida familiar e social e, por isso, precisa ser combatido pela educação familiar. 

No texto citado, alguém pede a Jesus que fosse juiz numa disputa de família. Ao que parece, dois irmãos vinham discutindo a respeito de uma herança após a morte do pai. O irmão mais velho, na opinião do mais novo, não tinha cumprido o que estava especificado no testamento. O argumento para a injustiça na divisão não é descrito, mas uma característica comum nas discordâncias dessas partilhas eram os motivos religiosos, como o descumprimento do mandamento de honrar pai e mãe por parte de um filho por exemplo. 

O rapaz que procurou Jesus e solicitou a sua intervenção parece ter ido sozinho, pois não há registro no texto do irmão que retém a parte do outro e muito menos que tenha concordado em convidar uma terceira pessoa para avaliar a situação. O solicitante chega a Jesus o chamando de mestre, que quer dizer rabino, porque os rabinos conheciam a Lei e, por vezes serviam como conciliadores nesses casos, no entanto Jesus negou-se a se envolver na disputa e a servir de árbitro entre as partes. Não se deixou ser usado por alguém que era movido pelos próprios interesses, pois sabia que qualquer resposta que desse não resolveria o verdadeiro problema. 

Quando observamos o uso da segunda pessoa do plural “vós” (Lc. 12:14) percebemos que Jesus já tinha diagnosticado que a raiz da disputa era a avareza enraizada no coração dos dois irmãos, portanto, enquanto os dois homens fossem gananciosos, nenhum acordo seria satisfatório, já que a maior necessidade era uma transformação do coração de ambos. 

Por isso, depois de ter-se dirigido diretamente ao homem, Jesus passou a ensinar à multidão, fazendo-lhes uma recomendação geral contra a ganância e, por meio de uma parábola, oferece pelo menos dois antídotos contra o veneno do egoísmo e sua reação toxica que se manifesta no acúmulo de bens. 

A primeira dose do fármaco injetado pelo Evangelho é a partilha daquilo que Deus graciosamente nos dá. O apóstolo Paulo afirma que a ganância é idolatria (Col. 3.5), isto é, quando o culto é oferecido a criatura em lugar do Criador, assim, Jesus foi direto à raiz do problema apresentado pelo homem. 

Essa parábola, que leva o titulo de “o rico insensato”, tem a intenção de afirmar que a vida, no seu desenvolvimento, não depende do armazenamento de riquezas materiais, pois, ao contrario do que se escuta a riqueza não traz felicidade, antes, é, muitas vezes, causa de ruína e destruição. 

Na história de Jesus, um fazendeiro muito rico teve um verão excepcional, porque na ocasião da safra ele teve uma colheita abundante. Após constatar o bônus na produção o fazendeiro começa a considerar consigo mesmo o que fazer com a colheita extraordinária e onde guardá-la. 

Sua decisão surge, no texto grego, com uma ideia repentina: “Já sei! Destruirei os meus celeiros e reconstruirei maiores e aí recolherei todo o meu produto e todos os meus bens”. Um detalhe importante nesta conversa interna do fazendeiro é o uso dos pronomes “eu” e “meu” repetidamente, pois isso revela seu extremo egoísmo, já que não leva em consideração a graça inesperada de Deus, quando concede a ele uma colheita recorde, mas mostra seu total desprezo a um favor quando decide derrubar seus celeiros e construindo outros maiores para sua segurança por alguns anos. 

O fato de ambicionar o controle completo do futuro revela que não se sentia seguro em depender de alguém, mesmo que fosse de Deus, mas o que mais impressiona é que em nenhum momento passa pela sua cabeça a ideia de ajudar alguém que, ao contrario dele, não teve uma produção excepcional, mas perdeu sua safra para as pragas ou para o clima. Só conseguiu pensar em si mesmo, e isso não se revela apenas no desejo de ampliar seus depósitos, mas na motivação para executar esse trabalho: “Então direi à minha alma: armazenaste muitos bens para vários anos; descansa, come, bebe, alegra-te". 

Toda essa consideração exagerada para consigo mesmo é construída sobre o egoísmo, porquanto todo o círculo de sua vida tinha se reduzido a um ponto, demostrando, assim, que o egoísmo revelado na ganância não se caracteriza por pecados de comissão, mas, sim, por pecados de omissão, ou seja, não é pelo que se faz em si, pois parece justo melhorar suas instalações para receber mais de Deus, mas é pelo que se deixa de fazer, isto é, repartir com os outros as bênçãos de Deus. 

Esse homem, de alguma maneira, supôs duas coisas, primeiro que a colheita incomum era resultado de algum mérito, e depois que aconteceu como um sinal de que suas outras safras seriam deficitárias e, por isso, deveria se precaver. 

Quando não dividimos as bênçãos atípicas de Deus, ou seja, entradas com as quais não contamos, e as retemos com o medo do futuro, como se o controlássemos, exteriorizamos a ganância, fruto do nosso egoísmo. 

Essa é a sutil diferença entre ser controlado e avarento com respeito aos bens materiais, isto é, a evidência de alguém equilibrado na sua economia é resguardar sua poupança para um objetivo estipulado e, quando chega o momento, investir no proposito predefinido, enquanto o indicador de alguém ganancioso é reter tudo o que tem adquirido apenas para poder ter o controle sobre as possibilidades e não para um fim especifico. 

Em outras palavras, o avarento cobiça a soberania de Deus, pois não tem apenas o desejo pelas coisas momentâneas, mas também pelo total controle sobre as possibilidades da existência, como se dissesse: Eu posso ter um carro de ultima tecnologia ou uma grande casa nova, mas não quero!  

A resposta do Pai ao homem, descrita por Jesus, é a segunda dose do remédio injetado pelo Evangelho, ou seja, o entendimento da fragilidade da vida, pois Deus interrompeu os planos do homem rico de uma maneira permanente depois de explicar que o seu egoísmo era uma loucura, porquanto toda a sua prepotência sempre pôde ser suspensa instantaneamente. 

A morte não é apenas o cancelamento da existência, mas também a interdição na administração de todos os bens acumulados durante ela, uma vez que é por meio dela que Deus chama o homem para prestar contas da sua administração. O fazendeiro rico tinha empilhado sua colheita em celeiros e acumulado riqueza suficiente para vários anos, mas porque ignorou o próximo, nem havia ajustado contas com Deus, seu saldo nos céus estava à zero.  

E o mais importante, quando gastou todo o tempo pensando só em si mesmo e não percebeu que o fim dessa gestão poderia acontecer a qualquer minuto, esqueceu que quando a conta fosse encerrada seria em definitivo, por isso as palavras de Jesus são fatais: “esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado para quem será?”. 

Devemos perceber que, em nenhum momento, Jesus diz que o homem deve se privar de riquezas terrenas, prazer e bem-estar. Nem tentou dizer ao irmão mais novo, que o procurou com uma queixa a respeito de sua parte da herança, para desistir do que era seu por direito. 

Mas devemos compreender que Deus é o dono de sua grande criação, e que colocou o homem como mordomo do mundo que criou. Como esse administrador, o homem deve periodicamente prestar contas a Deus e quando deixa de fazê-lo e age como se fosse não só proprietário dela, mas também seu provedor. É exatamente aqui que infringe o mandamento de Deus e se condena a loucura, uma vez que passa a viver apenas para si mesmo. 

Na presença de Deus, nossas mãos estão sempre vazias e apenas o que oferecemos a Deus e a nosso próximo é que permanecerá, pois, se essas ofertas possuem um valor espiritual, a morte não pode tomá-las de nós, já que são constituídas de amor e gratidão. 

É Apenas no Evangelho que podemos anular o egoísmo em nós ao mesmo tempo em que armazenamos tesouros nos céus e nos tornamos ricos para com Deus. 

Soli Deo Glória!

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